25 de março de 2013

Negrinho do Pastoreio (para Marco Feliciano)




Negrinho do Pastoreio (Poema para Marco Feliciano)

Feliciano nega suas raízes
Crespas, agora alisadas,
Negras, agora maldição
Seu cabelo é síntese do que tenta esconder, tentando encontrar redenção num pote de henê

Feliciano quer deixar de ser...
Sua mãe, cara de bolacha brasileira,
Não nega a étnica mistura.
Mas seu espelho reflete, diariamente,
o tamanho de sua tortura.
Vaga sem entender quem é
E se esconde sob o título de pastor. 
Grita coisas desconexas na igreja, mas à noite padece de desespero,
Insônia e dor

Feliciano tem raiva dos gays, 
Mas faz a sobrancelha!
E tem raiva da mulher divorciada
E da família monoparental
E de tudo que lembre a fragilidade do seu reflexo.
De tudo que revele sua problemática com sexo

À noite, quando se depara com o monstro que o devora
Feliciano chora, ora, mas Deus finge não ouvir. 

Quando sonha, é pesadelo
Chuvas de pirocas e grelos o perseguem em uma tribo negra
Acorda sobressaltado, faz o sinal da cruz e agarra a bíblia

Corre no armário e saca a fantasia de pastor
Um terno, seu único meio de ser tratado como "doutor"

Tenho pena deste homem,
Que distorce todos os princípios de amor que nos foi ensinado
E vive uma vida de dublê,
"Fiel perseguidor de viado"

Mas a verdade não vai calar:
Feliciano, está na cara,
Não adianta alisar. 

Seu DNA é de negro
Sua auto-maldição, degredo
Salve-se antes que acabe o tempo,
Afaste-se, antes que desabe o templo

David Lima

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