1 de fevereiro de 2011

Picadinho do tempo calado

Sigo, sem desespero, como se seguisse os passos de uma coreografia. Apuro as coisas, me emociono menos. Queria ter gritado e chorado de felicidade e fiquei boquiaberto apenas quando tem surpresa boa. Quiça são os trinta, minha mente resmunga. Observo o mundo, faço anotações mentais, planejo um livro, um filme, uma cena, mas a vida é mais rápida e acabo ilhado, ilha de edição falida. E acho graça das velhas de Copacabana discutindo por serem velhas e terem direitos de velhos assegurados por lei. E depois sou eu, jovem ainda, a discutir com o motorista do ônibus. como se eu fosse uma velha. Metade das coisas no Brasil se consegue mediante discussão. A outra metade com processo.

Durmo, acordo, o mundo renasce toda manhã para meu ácido registro. Me canso desta cidade, deste país, talvez tenha cansado do mundo, mas jamais me cansarei das pessoas, por isso vale a pena renascer toda manhã, como a manhã, como amanhã renascerei para ser de novo eu, mas ser também outro. Porque o excesso de Fernando Pessoa me tornou muitos, porque as doses de Clarice me tornaram fragmentado. Saramago e seus detalhes me encantam e me irritam e tudo isso vem pra escrita. Por ter viajado muito fiquei menos brasileiro e nem por isso sou cidadão de outro país. Culpem a globalização, sou fruto dela. Fruto do real forte, fruto das compras parceladas e da banda-larga. Odeio o motorista que grita Vaaaaan pro jacaréeeee na Presidente Vargas.

Não tenho um estilo, não tenho planos, não tenho ansiedade adolescente. Vai ver a gente sente mais quando é adolescente. Devem ser os hormônios, deve ser o mundo. Deve ser eu. Vai ver era pra eu estar dormindo. Vai ver tenho andado acordado demais. Vai ver quero ver três anos em um. Vai ver vai dar tudo certo. Vai ver vai dar. Por ora sabemos apenas que tudo há de ser como será. Não se espera o futuro, o futuro não nos espera. Espero que sim, que ele esteja lá na frente com sua alma de menino que é disso que é feito nosso amor, é disso que é feito o amor, dessa sensação de ser criança todo dia e ainda poder fazer travessuras mais prazerosas ainda, posto que nosso corpo permite.

No fim, o amor nos salva de nós mesmos.

4 comentários:

Carla Vergara disse...

querido, como é bom qdo vc escreve. me alinho a tudo na tua poética, menos com...: vc tem estilo para-caraleo! beijos cheios de saudades de te ouvir.

David Lima disse...

pera lá. você não tem nada estilo? tem sim senhora. sou teu fã e estou esperando teu livro. e não digo isso porque comenta e gosta do que escrevo. digo porque é verdade.

beijos e tenho que aparecer em recitais, senão o povo vai achar que virei poema. hahaha.

Quita disse...

Ai como me identifico com o que escreves. No meu caso é mais algo como: por estar tanto tempo fora há momentos que me sinto mais brasileira que os outros, que nunca. Tenho a necessidade de respirar o Rio, as amendoeiras, as imperfeições do sotaque. Mas, confesso, quando regresso e retomo o tempo de outrora... Estranho, debato-me e a sensação fica por um tempo. "Deve ser os hormônios, deve ser do mundo, deve ser eu".

Roberta Abranches disse...

te entendo, e mesmo com ar de revolta, você continua cheio de leveza e poesia fluída. Você não deixou o pessimismo te endurecer, que nada te endureça!

comecei a escrever meu blog... dá um pulo lá, antes de nossas viagens mundo afora, ou mundo adentro... rs bjos

http://artesbrincantes.blogspot.com