17 de abril de 2010

Rick Baleiro, um brasileiro

Entrou, negro bonito, cabelo com penteado afro, sorriso branco alvo, ofegante com sua caixa de balas Stickfru no 175 que ia para a Barra da Tijuca. Posicionou-se perto da roleta, me olhou e eu disse: Tá cansado né? Ele respondeu: Desde 6 da manhã vendendo bala e iniciou sua oferta: Estoutrazendoaquideliciosasbalasquecustam! E calou-se. Fixou o olhar no fundo do ônibus e ficou quase que por um minuto em silêncio olhando para todos...

Eis que de repente dispara: Cinquenta centaaavos! Ahhh! Estava todo mundo ansioso pelo preço né? A gargalhada foi geral. O trânsito horrível que nos engolia, sumiu neste momento.

Mas a surpresa ainda estava por vir. Entregou a cada potencial consumidor a bala e um papel com algo escrito. Aos que se negavam em pegar o papel dizia: “Pega, não estou contando tristeza não.” Dizia o papel:

“Sr. Passageiro. A 5ª (e talvez a última) mensagem do baleiro pergunta: LEMBRA DAS PROPOSTAS DE SEU CANDIDATO E SE ELE CUMPRIU COM SEUS DEVERES? ELE FOI RESPONSÁVEL PELAS MUDANÇAS EM SEU BAIRRO E/OU COMUNIDADE? E O QUE VOCÊ FEZ PARA COBRAR AS PROMESSAS NÃO REALIZADAS?

Em breve estaremos em época eleitoral e já sabemos o que esperar. Se votarmos nesses políticos vai continuar essa situação vergonhosa que estamos, com menos esperanças para nossos filhos e netos e vendo os poderosos ficarem mais ricos. E aí, vai votar em quem? A memória é algo fundamental em nossas vidas. Sem ela, criaremos uma sociedade sm identidade e ideais. OBRIGADO! Rick Baleiro, um brasileiro."

Quando ele retornou para recolher a mercadoria, fazia questão de deixar o papel para todos, mesmo para quem não comprasse a bala. Eu disse-lhe: Estou impressionado com isso que você escreveu no papel. Jamais imaginei que o papel pudesse ter isso escrito. É impressionante o que você está dizendo aqui... As pessoas te olham e vêem um baleiro (inclusive eu), mas com apenas um pequeno papel você revelou ter uma consciência política, cidadã incrível. Eu nem gosto de bala, mas eu vou comprar só pelo papel, só pelos dizeres.

Ele riu, afetuoso e disse: As pessoas não sabem a missa a metade! E saiu do ônibus, não sem antes agradecer, obrigado! A partir deste momento passei a acreditar que o Brasil tem sim futuro. Se cada cidade tiver ao menos um Rick Baleiro, um brasileiro, o futuro parecerá doce e não me refiro à bala.

2 comentários:

Aline disse...

Tão bem descrito que pude ser tranportada para o onibus e ficar igualmente enamorada de Rick de sorriso largo e respiração ofegante que com bom humor e criatividade tenta tocar no coração das pessoas ... o meu ele consegui!
Adorei!
sempre bom te ler...
Aline.

André Auke disse...

Adoro essas situações ao qual coloca nosso julgamento no chão e nos dá a oportunidade de ver as pessoas sem os rótulos.
É sempre possível aprender a cada segundo da vida.
Parabéns pela história.
Abraços.