7 de abril de 2008

A misericórdia está intacta!



Eu não me recordo com exatidão mas lembro que era uma manhã que tinha tudo pra ser triste, monótona, simples, angustiada, fria, esse frio pré-Outono que me é alérgico e incômodo. Tinha tudo, exatamente tudo para me fazer beber mil xícaras de café para aquecer o corpo e desinchar os olhos recém-despertos para mais um dia que já soava monótono, que não despertava nada em mim. Porém ao contornar o corredor, já na cozinha, fazendo pose e remediando o irremediável, ela estava lá: colorida, simples, milagrosa no meio da suposta igualdade do dia-a-dia que nos segue. Talvez seja duro acreditar, mas sem poetizar, refez-se em mim tudo e desde então nunca mais tive medo do mundo. Observei-a maravilhado por muito tempo e depois a transportei para um vaso de violetas que existe aqui em casa. Ao fim do dia, ao reparar no vaso, ela já havia partido. Sei hoje que aprendeu a voar e mais que isso: ensinou-me esta mágica também!

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O acontecimento ainda me fez lembrar deste poema:

(Adélia Prado - Meditação à beira de um poema)

Podei a roseira no momento certo
e viajei muitos dias,
aprendendo de vez
que se deve esperar biblicamente
pela hora das coisas.
Quando abri a janela, vi-a,
como nunca a vira
constelada,
os botões,
Alguns já com rosa- pálido
espiando entre as sépalas,
jóias vivas em pencas.
Minha dor nas costas,
meu desaponto com os limites do tempo,
o grande esforço para que me entendam
pulverizam-se
diante do recorrente milagre.
maravilhosas faziam-se
as cíclicas perecíveis rosas.
Ninguém me demoverá
do que de repente soube
à margem dos edifícios da razão:
a misericórdia está intacta,
vagalhões de cobiça,
punhos fechados,
altissonantes iras,
nada impede ouro de corolas
e acreditai: perfumes.
Só porque é setembro

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